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Como foram capturadas as "viradas de casaca"

Para cada parlamentar, foram consideradas as comunicações de mudança de partido feitas à Câmara entre 3 de março e 1 de abril deste ano por meio do endereço: http://www.camara.leg.br/internet/deputado/pesquisaHistorico.asp. Dos 513 deputados federais, 82 (15,98% da câmara) mudaram de partido no período permitido pela chamada "janela partidária".

Determinada pela Reforma Eleitoral de 2015, a "janela partidária" é o período em que deputados podem mudar de partido sem correrem o risco de perder o mandato por infidelidade partidária. Apesar de o período de abono incluir também deputados estaduais e senadores, este trabalho considerou, neste primeiro momento, as trocas de partido de deputados federais.

Como foi calculado o valor do passe de cada deputado

Em 2015, o STF considerou inconstitucional contribuições de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais. Desde então, para financiar suas campanhas, os candidatos dependem de dinheiro público, vindo do fundo eleitoral e do fundo partidário, e de doações de pessoas físicas, inclusive o autofinanciamento.

O valor do passe de cada parlamentar presente neste trabalho desde 2018 foi calculado a partir da soma de três valores: o fundo eleitoral, o fundo partidário e o bônus puxador, de acordo com o peso político de cada parlamentar. Mas em 2022, entrou em vigor uma nova lei que adicionou um quarto valor na conta, que chamamos de “bônus incentivo”.

a. O fundo eleitoral, de R$ 4,9 bi

Pela lei 13.488, de 6 de outubro de 2017, as regras para a divisão do fundo eleitoral, oficialmente chamado de Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), são:

I - 2% (dois por cento) dividido entre todos os partidos registrados no TSE;

II - 35% (trinta e cinco por cento), divididos entre os partidos que tenham pelo menos um representante na Câmara dos Deputados, na proporção do percentual de votos por eles obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados;

III - 48% (quarenta e oito por cento) divididos proporcionalmente entre a quantidade de deputados de cada legenda, consideradas as legendas dos titulares em 28 de Agosto de 2017;

IV - 15% (quinze por cento) divididos proporcionalmente ao número de senadores, consideradas as legendas dos titulares em 28 de Agosto de 2017.

Considerando que o montante do bolo, disponibilizado pelo Tesouro Nacional ao TSE em 1º de junho de 2020, é de R$ 4.961.519.777,00, a repartição entre partidos é feita da seguinte forma:

Pela regra I, temos R$ 3.100.949,86 para cada um dos 32 partidos hoje cadastrados no TSE;
Pela regra II, R$ 1.736.531.921,95 serão repartidos de acordo com a proporção dos votos de cada deputado nas eleições de 2014;
Pela regra III, R$ 4.642.357,68 é o valor que cada deputado garante ao partido;
Pela regra IV, R$ 9.187.999,58 é o valor que cada senador garante ao partido.

Desta maneira, conforme o TSE, cada partido tem garantido do fundo eleitoral os seguintes valores:

AVANTE R$ 69.241.914,34
CIDADANIA R$ 87.941.006,94
DC R$ 3.100.949,86
MDB R$ 363.284.702,40
NOVO R$ 90.108.682,88
PATRIOTA R$ 86.488.932,80
PCB R$ 3.100.949,86
PCdoB R$ 76.076.392,78
PCO R$ 3.100.949,86
PDT R$ 253.425.162,09
PL R$ 288.519.066,50
PMB R$ 3.100.949,86
PMN R$ 3.100.949,86
PODE R$ 191.385.989,03
PP R$ 344.793.369,45
PROS R$ 91.407.652,36
PRTB R$ 3.100.949,86
PSB R$ 268.889.585,68
PSC R$ 76.226.112,45
PSD R$ 349.916.884,56
PSDB R$ 320.011.672,85
PSOL R$ 100.044.052,18
PSTU R$ 3.100.949,86
PT R$ 503.362.324,00
PTB R$ 114.492.248,59
AGIR (ex PTC) R$ 3.100.949,86
PV R$ 50.575.220,77
REDE R$ 69.668.368,67
REPUBLICANOS R$ 242.245.577,52
SOLIDARIEDADE R$ 112.956.557,72
UNIÃO R$ 782.549.751,69
UP R$ 3.100.949,86

b. O fundo partidário, de R$ 3bi bi somados de 2019 até agora

Já o fundo partidário para o quadriênio 2019-2022 é de R$ 3.071.242.521,93. Os repasses foram de R$ 728,2 milhões em 2019, R$ 836,9 milhões em 2020, R$ 872,8 milhões em 2021, e de R$ 633,2 milhões (divulgados até agosto, no momento da publicação deste texto) em 2022.

Conforme a lei 11.459, de 21 de março de 2007, as regras para a divisão do fundo são:

I - 5% é repartido em partes iguais a todos os partidos;

II - 95% é distribuído entre às legendas na proporção dos votos obtidos na última eleição geral para a câmara dos deputados.

Pela regra I, nos quatro anos, temos um montante de R$ 4.798.816,44 para cada um dos 32 partidos;

Pela regra II, R$ 2.917.680.395,83 foram repartidos na proporção dos votos nos quatro anos.

c. O "bônus puxador"

As regras para eleições proporcionais acabam gerando o fenômeno dos "puxadores de votos". Um candidato que consegue quociente eleitoral (QE) maior que 1 garante, individualmente, a conquista do seu mandato e ajuda a "puxar" outro(s) candidato(s) de sua coligação.

Para quantificar o valor dos puxadores de voto, este modelo analisou os QEs da eleição de 2018. O QE é determinado pela divisão do número de votos válidos pelas cadeiras em disputa em cada estado.

Usando como exemplo um candidato que tem QE 3, além de garantir sua candidatura ele elege mais 2 candidatos de sua coligação.

A regra III do fundo eleitoral garante que 48% do fundo sejam distribuídos igualmente pelos seus 513 parlamentares eleitos, o que perfaz um total de R$ 4.642.357,68. A partir disso, podemos considerar que o "puxador" com QE 3 foi responsável pela conquista de 3 vezes esse valor.

Portanto, o valor do bônus segue a fórmula abaixo:

Bônus Puxador = (QE - 1) x R$ 4.642.357,68

d. O "bônus incentivo"

Em setembro de 2021, a Emenda Constitucional (EC) nº 111/2021, estabeleceu que os votos dados a a candidatas mulheres e candidatos(as) negros serão contados em dobro para efeito da distribuição dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral nas eleições de 2022 a 2030. Isso se dá pela justificativa de incentivo à candidatura de mais pessoas que fazem parte de grupos minoritários.

Como não é possível saber o perfil das pessoas que serão eleitas em 2022, para colocar esse valor na conta consideramos uma projeção em que o cenário racial e de gênero dos candidatos eleitos em 2018 irá se repetir nas eleições deste ano, assim como a expressão de votos recebidos por eles. A partir desse cenário, foi multiplicada por 2 a quantidade de votos de todos os candidatos eleitos que se enquadram no perfil contemplado pela nova EC. Os votos válidos para deputado federal em 2018 totalizaram 117.111.570; com a multiplicação, temos um novo total de 137.060.671. Esse novo número foi usado como denominador para a divisão dos fundos proporcional ao número de votos.

Assim, o cálculo do bônus para cada candidato se deu com a seguinte fórmula:

Bônus Incentivo = (Quantidade de votos / Novo total de votos válidos) x 95% FP + (Quantidade de votos / Novo total de votos válidos) x 35% FE

Passe passo a passo

Cada político vira-casaca teve o valor do passe considerando essas três variáveis acima. Veja um exemplo:

Deputado vira-casaca Eduardo Bolsonaro

Eduardo Bolsonaro obteve 1.843.735 votos na eleição para deputado federal de 2018.

Havia 513 cadeiras em disputa, sendo 70 destinadas a São Paulo.

No estado de São Paulo, o quociente eleitoral (votos válidos/cadeiras em disputa) foi de 301.873.

Assim, o vira-casaca de maior passe obteve aproximadamente 6,11 vezes o quociente eleitoral e 1,57% do total de votos real. Para efeito do cálculo do bônus incentivo e da divisão dos fundos, sua porcentagem sobre o novo total de votos seria de 1,34%.

Calculando o valor do passe

Fundo Eleitoral

Pela regra II
"35% (trinta e cinco por cento), divididos entre os partidos que tenham pelo menos um representante na Câmara dos Deputados, na proporção do percentual de votos por eles obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados."

Sozinho, por esta regra, Eduardo Bolsonaro trouxe R$ 1.736.531.921,95 x 1,34% = R$ 23.359.762,21.

Pela regra III
"48% (quarenta e oito por cento) divididos proporcionalmente entre a quantidade de deputados de cada legenda, consideradas as legendas dos titulares em 28 de Agosto de 2017."

Cada deputado garantiu R$ 4.642.357,69 ao seu partido, independentemente de votação.

Somados os valores, Bolsonaro trouxe R$ 28.002.119,90 do Fundo Eleitoral para sua legenda.

Fundo Partidário (2019-2022)

Pela regra II
"95% (noventa e cinco por cento) é distribuído entre as legendas na proporção dos votos obtidos na última eleição geral para a câmara dos deputados."

Sozinho, por esta regra, Bolsonaro trouxe R$ 2.917.680.395,83 x 1,34% = R$ 39.248.527,13.

Bônus Puxador

Bolsonaro obteve 6,11 vezes o QE. Considerando-se que 1 QE é o valor necessário para que um candidato se eleja a uma cadeira, o puxador de votos tem 5,11 de "sobra". Esse valor são cadeiras em potencial.

Aplicando ao valor de cada cadeira (regra III, fundo eleitoral), temos:

5,11 x R$ 4.642.357,68 = R$ 23.722.447,74

Eduardo Bolsonaro não recebeu bônus incentivo, uma vez que não se enquadra no perfil minoritário contemplado pela nova Emenda Constitucional. Então, somados os valores dos fundos eleitoral e partidário junto ao bônus de quociente eleitoral, o passe de Eduardo Bolsonaro vale R$ 90.962.190,98.